Há muitos elementos que indicam que um novo partido político de esquerda pode estar em gestação. O cavalo de pau dado por Dilma após a eleição em que venceu montada num discurso de centro-esquerda e a incapacidade do PT para reagir à sua demonização, estão levando intelectuais, líderes sociais, políticos de esquerda e personagens dos novos movimentos a realizar eventos e iniciar conversas que ainda não têm como objetivo a formação de um partido, mas que tudo indica pode desembocar nisso.
No meio da crise do mensalão houve um movimento relativamente semelhante que levou à criação do PsoL, mas naquela ocasião o que unificava os descontentes era um sentimento muito balizado por petistas que queriam saltar do barco e criar um novo espaço de representação. E que de alguma forma tinham a ilusão de que a então senadora Heloísa Helena, que fazia um discurso quase de ódio ao seu ex-partido, poderia se tornar uma liderança de caráter nacional.
O PsoL foi criado para fazer contraponto ao PT, não para combater a direita e construir um campo conectado aos movimentos sociais. Com o tempo, o partido foi achando um melhor caminho e novos representantes e hoje é muito melhor do que no seu início. Mas fora do Rio de Janeiro o PsoL não tem base popular significativa e por isso nas disputas eleitorais ainda patina em votações nanicas.
Hoje não são apenas lideranças políticas que estão achando que o PT pode ter perdido sua capacidade de liderar a centro-esquerda no Brasil. Há um sentimento ainda difuso que tem movimentado muita gente de setores populares a achar que talvez seja hora de criar uma nova alternativa política.
Hoje, movimentos do campo, da habitação, do sindicalismo, da cultura, da democratização da mídia e de tantos outros setores começam a pensar se de fato as bandeiras que levaram Lula ao poder não precisam de novos ares.
O PT, claro, ainda é muito forte. E teria como re-incorporar esse sentimento. Mas precisaria dar sinais a partir do governo Dilma. A fase do discurso de esquerda com governo de direita em algumas áreas não cola mais. As nomeações de Kassab e Kátia Abreu tiveram um simbolismo muito mais traumático do que o cálculo político dos pragmáticos poderia prever.
Além disso, Dilma parece refém do PMDB e da política econômica de Joaquim Levy. E o PT está amarrado aos mandatos dos seus parlamentares e governantes. Muitos deles com interesse em tudo, menos em mudanças que possam tirar algum naco do seu poder interno.
Junta-se a isso o sucesso do Podemos, na Espanha, e do Syriza, na Grécia. Esses partidos foram criados em meio a crises de representação, apostando num discurso popular e de esquerda. E estão mais conectados às novas formas de organização que resultam de processos menos verticais e mais de ação em rede.
Construir um novo projeto de esquerda no Brasil está longe de ser um desafio fácil. E por este motivo muita gente ainda que começa a conversar sobre saídas para a esquerda ainda não arrisca abrir mão de uma liderança, por exemplo, tão importante e simbólica quanto Lula. É a figura de Lula que segura essa ainda marola que pode virar uma onda.
Mas as declarações do senador Paulo Paim (RS) ontem para o Estado de S. Paulo e o movimento de muitos grupos que têm realizado encontros com centenas de pessoas sinalizam que um Lula sem poder e uma Dilma ignorando os setores que a elegeram podem animar os mais reticentes.
Ainda é cedo para prever cenários, mas que há algo novo em curso não tenha dúvida disso.
Fonte: Revista Forum, 26/03/2015
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