segunda-feira, 2 de novembro de 2015

O Notijudiciário brasileiro e as “boas” reputações - institucionais




*Marconi Moura de Lima
Cada dia tenho tido dificuldades em levar a sério a minha República. E não sou o tipo medíocre cotidiano que carrega consigo uma síndrome que nos diminui [enquanto Nação], o tipo vira-latas. Meu rancor emergente está relacionado ao conteúdo nacional preposto, qual seja, a canalhice de uma elitezinha mesquinha e sem sal que teima em arvorar-se ao universo da vida e das coisas somente para pensar em si mesma – sem que sobre espaços à partilha dos insumos e da vida a todos os demais (ao povo).

Com base em que aspectos diria isso? Melhor represar meus [anti]sentimentos, cuja dor e a vergonha têm sido companheiras nestes últimos tempos por ter de conviver, veja: não com o contraditório, mas com o contraditório burro e sectário; jumento, por assim dizer, para daí enveredar-me sobre o arquétipo da reflexão de posturas e, quem sabe, ajudar a fazer com que dois ou três possam ter melhor abordagem quanto ao falsário momento democrático que vivemos. Destarte, vamos nos ater em atacar menos o sintoma, para nos lançar mais fortemente na causa. Paradoxo do diagnóstico. Portanto, relacionemos parte dessa elite distribuída: setores da Justiça; da Política; da Indústria; da Economia; outras. "Eu insulto as aristocracias cautelosas (...) / os duques zurros!" (ANDRADE, 1922).

Relevante considerar que todos estes componentes se engendram em tentáculos de outra elite ainda mais poderosa, na verdade um instrumento corporativo: a grande Mídia. Sua pedagogia é tão poderosa, tão intensa que produz seres servientes de sua própria difusão apodrecida. Assim sendo, conjugam poucos esforços para aportar reputações ao limbo e forjar outras tantas quais queiram consignar a seus propósitos. Além da tradição [brasileira] da novela que redistribui cognições e das programações ensurdecedoras a que a inteligência comum é incapaz de depurar, a força do jornalismo beira o surreal elemento construtor de novas realidades sobrepostas diante da verdadeiramente sensível.

Contudo, vão além. Extrapolaram quaisquer vestígios éticos escondidos sob as folhas caídas no chão pós-outono. O jornal "invadiu" os gabinetes magistrais, digo: magistrados. Ascenderam a quem operava o interesse dos seus, e apagaram a luz de quem usava o Direito em seu sacro-santo mandamento construído a mãos, sangue e inteligência seculares. O factóide das colunas de fofoca da grande imprensa resolvera também fotografar a rotina de um Poder tão relevante ao equilíbrio das forças proposto pelo Barão de Montesquieu (e vaidades afloraram adicionalmente). A isso resolvo chamar de "Notijudiciário". Ou seja: a Justiça feita pela Notícia. E vice-versa!

"Eu insulto o burguês!/ O burguês-níquel!/ O burguês-burguês!". Permita-me rapidamente avocar estas palavras do grande Mário de Andrade (1922) para fazer meu singelo desabafo (vocês são uns...) da sociedade brasileira contemporânea (hã?). É que dói um bocado e preciso fazer – vez e outra – essas rápidas notas de rodapé.

Quero voltar ao começo: não tenho como levar mais a sério meu País (?). Se vivêssemos numa civilização civilizada, jamais fechar escolas (como se faz no estado de São Paulo) seria motivo para menos protestos que fechar aos domingos a Avenida Paulista (na cidade de São Paulo) a fim de transformá-la por poucas horas num espaço de lazer e convivência de todos. Jamais "heróis" como o Augusto Nardes e o José Agripino (de fato e de direito, investigados por crimes – respectivamente: esquema de corrupção no Carf / Operação Zelotes; e corrupção no Detran-RN) teriam mais vozes que os filhos do ex-ministro Gilberto Carvalho (que em momento algum foram alvos de esquemas, ou suspeitos de quaisquer incidentes públicos). Tais questões ocorrem apenas em locais os quais loucos desgraçados matam reputações pelo sobejo do poder apequenado e têm respaldo de alguns mais ou menos sérios às ilações mortíferas.

Membros do Poder Judiciário, do Ministério Público, Polícia Federal selecionam que parte do Processo vão soltar para a imprensa. Se alguns de seus amigos convenientes estiveram nas Operações, tratam logo de adornar o sigilo, impor o instituto do segredo de justiça. Se são seus adversários, dar-se-á uma rasgadinha na Constituição e panfletam à sociedade os pedaços processuais capazes de abalar o imaginário da população. Viva a Idade Média brasileira!

É sério: a República está em xeque. Há um enorme risco de ela chafurdar. Se continuarmos nos deixando levar por esses "moleques de recado" da imprensa brasileira, associados a um conjunto de ignóbeis baluartes da ética seletiva lá dentro do Judiciário brasileiro, estaremos realmente acabados. A política eivada não se cura com déspotas disputando mesquinharias. A nossa dificuldade econômica não pode estar a rigor dos ventos enquanto homens ensimesmados disputam suas bandeiras (leia-se: interesses) em meio às braquiárias da Praça dos Três Poderes (com puxadinhos no Paraná e outras localidades).

Preocupo-me de a lisura mínima que construímos em séculos de instituições falidas resolvam avocar-se da esparrela convencional por trocados (níqueis) sem tanto valor perene. Possivelmente, se continuarmos a mensurar nossa democracia política pelo Notijudiciário (ouvindo estes ermos conteúdos propositados), haveremos pela guerra, ou pelo ostracismo sócio-institucional – o que não sei qual é o pior. Diz-nos Andrade: "Ódio aos sem desfalecimentos nem arrependimentos, sempiternamente as mesmices convencionais!". E eu completo com ele mesmo: "Todos para a central do meu rancor inebriante!". Fique dito!

*Formado em Letras pela UnB, pós-graduando em Direito Público, foi Secretário Municipal de Educação e Cultura em Cidade Ocidental, na região do Entorno de Brasília

Fonte: Brasil 247, 02/11/2015

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