Entrevista com a Senadora Marinor Brito
Quase uma semana depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir que a Lei da Ficha Limpa não vale para as eleições de 2010, a senadora Marinor Brito (PSOL-PA) ainda nem pensa em deixar o cargo para dar lugar a Jader Barbalho (PMDB-PA) – o segundo mais votado em seu estado. Barbalho, que foi barrado pela legislação por conta de pendências judiciais, já entrou com um processo no Supremo para agilizar sua posse no Congresso.
Marinor só conquistou o cargo no Senado porque dois políticos à sua frente foram barrados pela Ficha Limpa. Ela foi a quarta mais votada, atrás do campeão de votos, senador Flexa Ribeiro (PSDB), e dos fichas-sujas Barbalho e Paulo Rocha (PT). Em entrevista ao site de VEJA, Marinor Brito afirmou que está cumprindo normalmente sua agenda e criticou o ministro Luiz Fux, que deu fim ao impasse rejeitou a validade da lei.
A senhora já deixou o cargo? Permanecerei no mandato cumprindo todas as minhas tarefas até que todas as ações envolvendo a Ficha Limpa sejam concluídas. Ainda há muito tempo, muitos trâmites burocráticos e jurídicos até que se conclua esse processo. Enquanto isso, cumpro minha agenda.
Quanto tempo a senhora espera continuar no Senado? É difícil ter alguma previsão na Justiça brasileira. Todos os fichas-sujas tiveram tempo para recorrer, até depois de realizada a eleição. Estive com o presidente da OAB, Ophir Cavalcante, pedindo apoio para que todos meus direitos sejam garantidos. Por que eu, que cumpri todas as exigências da Justiça Eleitoral, não teria o mesmo direito?
A senhora se supreendeu com a decisão do STF? Fiquei frustrada e indignada ao ver retroceder o primeiro processo de lei de iniciativa popular, que tomou conta do debate para recompor os valores éticos e morais na política brasileira. A posição do ministro Luiz Fux foi um retrocesso histórico, virando as costas para o sentimento do povo brasileiro.
Mas o compromisso do Supremo não é com a Constituição? A Constituição tem que ser analisada à luz do interesse e da necessidade do povo. Ninguém pode dizer que a falta de ética, o abuso do poder econômico e o uso da máquina pública para apropriação pessoal é melhor do que tratar a máquina pública com responsabilidade. A Constituição brasileira, assim como a Lei da Ficha Limpa, foi feita para os brasileiros.
A senhora aprovou a indicação de Luiz Fux para a vaga de ministro no STF? O ministro traiu o Senado Federal. O que ele disse aqui foi completamente diferente de seu voto. Fux fez um discurso progressista, dizendo que a Justiça brasileira não poderia dar as costas para a intenção da lei, mostrando sensibilidade com o interesse público e com a ética na política. Mas o interesse dele era chegar ao Supremo. Quando alcançou o posto, nasceu outro Fux, que aceita que a eleição de 2010 possa ser disputada por pessoas corruptas. Não estamos tratando de um caso específico, mas sim de diversos casos e diversas formas de crime cometidos contra os cidadãos brasileiros.
Por que os candidatos ao Senado barrados pela Ficha Limpa receberam tantos votos no Pará? Enquanto não houver financiamento público de campanha e o poder econômico coordenar o processo eleitoral brasileiro, cidadãos corruptos vão continuar tendo muitos votos. No caso do Pará, enquanto não houver democratização da comunicação e as concessões públicas parem de sendo entregue aos políticos, as empresas vão continuar privilegiando os interesses particulares. As empresas de comunicação de Jader Barbalho, que dominam tanto jornais quanto rádio e TV, enalteceram sua figura 24 horas por dia durante as eleições. Esses votos não vão mudar a curto e médio prazo, a não ser que o poder legislativo tome alguma providencia. Lamentavelmente, não acredito que isso está próximo de acontecer.
A senhora tem sido muito procurada depois da decisão do Supremo? É só acessar meu Twitter, ver os recados no meu blog e as manifestações pelo telefone que tenho recebido. Isso é uma coisa positiva não somente porque eu estou sendo protagonista da questão da Ficha Limpa, mas pela relevância desse tema para o cenário político brasileiro.
O que a senhora pretende fazer enquanto for senadora? Planejo instalar a CPI do Tráfico Humano, participar da luta pela cidadania LGBT e pela democratização dos meios de comunicação. Meu objetivo é atuar na defesa dos direitos humanos no estado do Pará, dando prosseguimento às denúncias em relação à situação da saúde na região e outras deficiências. Estamos falando de um estado que é campeão em índices de trabalho escravo, desmatamento e prostituição infanto-juvenil. O Pará consta entre as principais rotas de tráfico de pessoas no Brasil, fruto das desigualdades sociais provocadas por governos que mais se apropriaram da riqueza do estado do que investiram em seu desenvolvimento.
Jader Barbalho é um bom representante do estado? Ele é representante dos interesses das elites do Pará, que dominam toda a rede pública. Mas acho que não há garantia de que é ele quem ocupará meu lugar. Ele terá que recorrer na justiça e há outros processos que envolvem a questão da Ficha Limpa.
E o senador Flexa Ribeiro (PSDB), primeiro lugar nas eleições? Embora não tenha tido problemas no processo eleitoral, o senador Flexa tem um histórico vinculado ao setor do empresariado paraense. Basta acompanhar a agenda do senador para observar que sua luta não é no combate às injustiças.
A senhora pretende se candidatar ao Senado nas próximas eleições? É muito cedo para decidir essa questão. Meu partido, o PSOL, não debate candidaturas do ponto de vista individual. Se na próxima eleição, ou na seguinte, meu nome for uma alternativa para defender o nosso programa, estarei pronta para a disputa.
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