Carlos Siqueira resiste à natural perda de poder que enfrentará com união de siglas. Saída construída por Márcio França em São Paulo selou Federação de esquerda
Brasil 247, 8/02/2022, 12:07 h Atualizado em 8 de fevereiro de 2022, 15:22
Por Luís Costa Pinto, do 247 – Na próxima 5ª feira, 10 de fevereiro, os presidentes do PT, do PSB, do PCdoB e do PV fazem em Brasília uma nova e decisiva reunião destinada a sacramentar a criação da Federação Partidária de esquerda reunindo as quatro legendas. Antes do Carnaval, provavelmente no fim da próxima semana, estará lavrada em ata a criação da união, que também será registrada em cartório com os compromissos programáticos básicos dos quatro partidos. Eles deverão permanecer unidos por quatro anos, compartilhando estrutura única de funcionamento no Congresso Nacional durante toda a próxima legislatura, como determina a lei.
O encontro do dia 10 se dará sob dois microclimas diversos:
O primeiro, é o da evidente união e entendimento entre a maioria dos partidos e de suas respectivas representações. PCdoB e PV, que chegaram a especular uma Federação com o PSB e sem o PT, já descartam essa possibilidade e seus presidentes advertiram Carlos Siqueira, presidente do PSB, que as duas outras siglas poderiam instituir uma aliança federativa com o PT e isso levaria a uma dispersão dos socialistas – um verdadeiro barata-voa na cena partidária. Siqueira, que tende a ser figadal ao negociar, refletiu sua insatisfação em entrevistas nas quais reciclou velhas pré-condições para a união e bateu o pé sobre a preponderância do ex-vice-governador Márcio França (PSB) como candidato ao governo paulista e quase impondo a retirada do nome de Fernando Haddad (PT) da disputa. Haddad é o favorito a vencer em todas as pesquisas pré-eleitorais realizadas de 2021 até hoje, quando o nome do ex-governador Geraldo Alckmin sai de cena. Na contramão da tensão criada por Siqueira, coube a França, em entrevista à GloboNews que foi ao ar na última segunda-feira, abrir a porta para uma entendimento “por cima” com o ex-ministro e ex-prefeito Haddad e acomodar-se numa candidatura a vice-governador ou ao Senado.
No programa Giro das 11, da TV 247, que foi ao ar esta manhã ancorado pelo jornalista Mauro Lopes, o senador Humberto Costa (PT-PE), deixou claro por que retirou seu nome da disputa pelo governo de Pernambuco. “Saio tranquilo, porque sei que foi um gesto em nome de algo muito maior, que é a mudança do nosso país", disse. Para ele, "a candidatura de Lula caminha para ser um movimento cívico que vai opor civilização e barbárie e todos têm que somar"
O segundo microclima que envolve a reunião da próxima 5ª é justamente o fato de ninguém entender mais o perfil amargo e solitário de Carlos Siqueira. O governador de Pernambuco, Paulo Câmara, que anunciou em entrevista à TV 247 já há três semanas (link no final deste texto) que apoiará o ex-presidente Lula e que trabalharia para Federação, disse ao presidente do PSB que 17 diretórios estaduais do Partido Socialista Brasileiro querem a Federação e a aliança com Lula no 1º turno. O diretório paulista não estava nesta contabilidade. Agora, são 18. O PT pernambucano, estado crucial para a celebração do entendimento, deu uma aula de política ao costurar a pacificação estadual dentro da própria base e com o PSB. No Espírito Santo, o governador Renato Casagrande (PSB), já ouviu da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e mesmo do senador Fabiano Contarato (PT), que a filiação do senador (egresso da Rede) não se deu pela candidatura ao governo e que ela “pode não existir”. No Rio Grande do Sul, o deputado estadual petista Edegar Pretto, favorito em todas as pesquisas pré-eleitorais, constrói uma aliança com Beto Albuquerque (PSB), que pode se candidatar ao Senado, e com Manuela D’Ávila (PCdoB). Siqueira, portanto, joga tensão onde deveria estar sendo encaminhado o entendimento.
Guimarães endureceu e mandou recados pelo PT
Em dura entrevista publicada ao jornal Folha de S Paulo e reproduzida pelo 247 o deputado José Guimarães, vice-presidente do PT, mandou recados diretos a Carlos Siqueira. "Ninguém pode querer ser mais do que outro se não tem voto para isso. Ele [Carlos Siqueira] manifestou na reunião, eu estava nela, e eu tinha entendido que havia um consenso que se respeitasse o princípio da proporcionalidade. Ninguém tira tamanho dos partidos por decreto. O partido tem representatividade social, tem voto. O PT é do seu tamanho e é desse tamanho que nós vamos para a eleição. (...) O PT não vai abrir mão de seu tamanho, porque estaríamos incorrendo em um erro grave", disse Guimarães na entrevista.
Sobre o entrave em São Paulo, onde o PT quer lançar o ex-ministro Fernando Haddad ao governo do estado e o PSB quer lançar o ex-governador Márcio França, o vice-presidente do PT lembrou que o seu partido já abriu mão da disputa em Pernambuco e está disposto a fazer o mesmo no Espírito Santo e no Rio Grande do Sul. Guimarães afirmou à Folha que vê desrespeito de Siqueira em relação a Fernando Haddad, líder nas pesquisas. "Humberto Costa acabou de fazer um baita de um gesto. Renunciou a uma candidatura que está em primeiro lugar. Isso não conta? Eu já falei para o Siqueira: no Espírito Santo é só o governador Renato Casagrande apoiar o Lula. (...) Com o Freixo [pré-candidato do PSB ao governo do Rio], já tínhamos discutido lá atrás [apoiar]. No Rio Grande do Sul nós vamos discutir lá na frente", afirmou na entrevista que deixou o presidente do PSB desconfortável.
Carlos Siqueira não soube fazer a gradação de suas ameaças para dentro do bloco partidário de esquerda, que joga pelo entendimento, e parece se isolar dia a dia dentro da própria legenda que preside. Ele é um respeitado administrador partidário: foi secretário nacional do PSB durante as longevas presidências de Miguel Arraes e Eduardo Campos, que presidiram a sigla por quase duas décadas. Porém, revela inabilidade ímpar para negociar sob pressão. Em 2014, depois da tragédia aérea que matou Campos, Siqueira se desentendeu com Marina Silva, candidata a vice que herdou a cabeça de chapa. Agindo de forma a dificultar o entendimento final pela Federação de esquerda, Siqueira parece estar mais preocupado com o futuro pessoal como comandante de uma sigla média do espectro político e não como co-artífice de uma costura inédita na cena partidária brasileira.
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