Opinião do colunista Reinaldo Azevedo
UOL, 29/08/2024 05h36
Imagem: René Goscinny e Albert Uderzo
O ministro Alexandre de Moraes deu 24 horas para que a plataforma X indique um representante legal no Brasil, sob pena de a rede ser suspensa. Para protesto ou ironia burra dos idiotas, a comunicação se fez por intermédio da própria X. A razão é simples: não há a quem entregar uma intimação, uma vez que Elon Musk decidiu que o Marco Civil da Internet, que exige um representante legal por aqui, não vale para a sua empresa
Um militante de extrema-direita disfarçado de "especialista em liberdade de expressão", que dá plantão a qualquer um que queira colher uma opinião contra o STF, especialmente contra Moraes, vocifera que o ato é ilegal porque a intimação não poderia ter sido feita desse modo. É mesmo? E qual seria o meio adequado? Sinal de fumaça?
A tese de que a STF só poderia agir por meio de uma carta rogatória é conversa para boi dormir. Não se trata de cooperação judicial entre países. A objeção seria uma estultice vergonhosa, não fosse má fé em estado bruto. Bem, de toda sorte, sempre resta a esperança de que o Musk decida contratar um abelhudo a peso de ouro. Apresentem-se, valentes!
É claro que a eventual suspensão da X pode gerar uma onda de desagrado contra o ministro e contra o Supremo. Mas, antes que se diga que o magistrado está caindo numa cilada armada por Musk — e eu mesmo já escrevi que é preciso, sim, tomar cuidado com este delinquente internacional —, cabe que se aponte uma alternativa. Qual?
Seria o quê? Abrir uma exceção, dispensando a X de ter uma representação legal, de modo a que o Marco Civil da Internet valesse para as outras empresas, menos para ela? Que se desse de barato que a plataforma poderia ignorar decisões judiciais, sem que nada lhe acontecesse e a seus representantes, dado que inexistem? Que o Judiciário, sabe-se lá por qual diploma legal, resolvesse acionar o indivíduo Elon Musk no Tribunal das Santas Escrituras?
Alguma resposta há de haver que não seja pura e simplesmente o descumprimento da lei.
"Ah, isso é tudo o que Musk quer..." Ele preferiu investir no impasse, já que passou a tratar a Corte como inimiga. Mais do que isso: emitiu no dia 17 de agosto um comunicado "urbi et orbi" — como se falasse a Roma e ao mundo —, informando que encerrava suas operações por aqui, ainda que mantendo disponível o serviço.
Assim, César Musk, o imperador, comunica às terras ocupadas de seu império que não reconhece a autoridade do Poder Judiciário nativo. É claro que a eventual suspensão das atividades da X geraria uma enorme dor de cabeça ao Supremo. Mas, então, é preciso que se aponte uma alternativa que não seja a admissão de que há um ente com autorização para operar acima da lei.
Se ela não é alcançada por decisões judiciais, então que se declare que estas terras passaram, oficialmente, à condição de colônia da X. Musk já realizou esse intento na Bolívia, por algum tempo, por intermédio de golpe de Estado.
Se não restar ao Supremo outro caminho, a X será suspensa. E não! Não se trata de um confronto "entre Moraes e César Musk". O ministro atua com respaldo de seus pares. Não ocorre, até onde sei, a nenhum ministro da Corte defender que decisões judiciais sejam ignoradas por quem quer seja, nativo ou não.
"Pô, Reinaldo, se Alexandre e o Supremo não tivessem tomado decisões contra a vontade do imperador..." Pois é. Isso nos devolve àquele ponto de sermos ou não uma colônia ocupada.
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