Ex-mulher do jogador, Dayanne Souza foi absolvida a pedido do MP. Promotor e advogados de acusação comemoram mais uma condenação de réus do caso
Goleiro Bruno chora em depoimento à juíza Marixa Fabiane - Renata Caldeira / TJMG
A leitura da sentença de condenação do goleiro Bruno Fernandes, concluída às 2h22 desta sexta-feira, encerrou uma etapa importante da resolução de um dos crimes mais macabros da história recente do Brasil. O ex-jogador do Flamengo, que desde junho de 2010 passou a ser acusado de comandar o sequestro e a morte da jovem Eliza Samudio, com quem teve um filho, foi condenado a 22 anos e três meses de prisão por quatro crimes: homicídio triplamente qualificado, ocultação de cadáver, sequestro e cárcere de Eliza e sequestro e cárcere de Bruninho. Dayanne Rodrigues Souza, sua ex-mulher, que participou do caso cuidando do menino Bruninho e respondia por sequestro e cárcere privado, foi absolvida a pedido do Ministério Público, que considerou ter ela agido “sob ameaça” dos demais réus.
Bruno, que sucumbiu aos poucos, indo de uma postura desafiadora, na época do crime e na fase de investigação, ao total abatimento, às lágrimas, apegado a uma bíblia, chorou ao ouvir o veredicto da juíza Marixa Fabiane Rodrigues. Marixa escreveu, em seu veredicto, que o julgamento concluiu haver “culpabilidade intensa e altamente reprovável”, agravada por ter o crime, entre seus réus, “um jogador de futebol famoso”. A juíza afirmou também que um dos agravantes é a “incógnita deixada sobre onde está o corpo da vítima”. “A sociedade reconheceu envolvimento do mandante (Bruno) na trama diabólica”, disse. O promotor Henry Vasconcelos Castro pretende recorrer da sentença, pois considera necessária pena entre 28 e 30 anos para o réu. A defesa também anunciou que já recorreu da condenação.
TEMA EM FOCO: Acompanhe o Caso Bruno
A condenação no Tribunal do Júri de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, foi fruto da decisão de sete jurados, cinco deles mulheres. O desfecho final do caso ainda está por vir, com o julgamento do ex-policial Marcos Aparecido dos Santos, o Bola, no dia 22 de abril. Dois ex-policiais ainda estão sendo investigados por suspeita de participação na ocultação de cadáver de Eliza – o mistério até hoje guardado por seus algozes. O Ministério Público, representado pelo promotor Henry Vasconcelos Castro, acredita que Bola seja o executor e o responsável pelo sumiço no corpo de Eliza.
Henry Castro comemorou mais uma condenação dos réus do Caso Bruno. Foi ele também quem obteve as condenações de Luiz Henrique Ferreira Romão, o Macarrão, e de Fernanda Gomes de Castro, ex-namorada de Bruno, que cumpre pena em regime aberto.
Iniciado na segunda-feira, o julgamento do goleiro Bruno foi bem menos tumultuado que o de Macarrão. E foi marcado por uma tentativa da acusação de reforçar a ideia de que Bruno participou da cena do crime – algo que a defesa e as testemunhas tentaram afastar – e que foi o mandante, a pessoa interessada em obter benefício com a morte de Eliza.
Primeira a ser interrogada ao longo do júri, Dayanne, que vinha mantendo-se em silêncio e chegou a afirmar, ao longo do processo, ter sofrido coação por parte da polícia e do MP, fez declarações importantes. Mas nenhuma delas encaradas como confissão. Para o conjunto do processo, as principais informações foram a atribuição de culpa a Bruno – segundo Dayanne, o ex-marido pediu que ela mentisse sobre a presença do menino Bruninho, já depois da morte de Eliza – e a declaração incisiva em relação ao ex-policial José Lauriano de Assis Filho, o Zezé. Este novo personagem, que esteve presente no motel em que Eliza e os acusados pernoitaram, a caminho do sítio do goleiro, e é suspeito de participação na ocultação de cadáver, corre risco de enfrentar também um julgamento semelhante. Além dele, há um terceiro policial sendo investigado no caso – os dados são mantidos em sigilo, apesar de um vazamento ter legado a Polícia Civil mineira a confirmar a existência do inquérito. Henry Castro explicou, ainda no plenário do Tribunal do Júri, a razão de não ter denunciado Zezé. "Ainda não recebi todos os elementos no tempo que gostaria", disse Henry.
Cronologia - Relembre os principais fatos do Caso Bruno
Com um forte conjunto de provas – apesar de o corpo nunca ter sido localizado – a defesa de Bruno ficou diante do seguinte cenário: o goleiro admitiu saber que Eliza Samudio seria assassinada, afirmou que se beneficiaria disso, pediu à ex-mulher para mentir sobre o menino Bruninho. Tudo isso em um julgamento que começou com uma certeza: a vítima está morta, independentemente de o corpo nunca ter sido encontrado, e a causa da morte foi asfixia.
A manutenção da validade do atestado de óbito de Eliza Samudio, emitido em janeiro, a pedido da juíza Marixa Fabiane Rodrigues, começou a definir como acusação e defesa se posicionariam ao longo do julgamento de Bruno. A defesa tentou invalidar o documento para, assim, ter a opção de sustentar a negação do crime. A estratégia não funcionou, e o júri começou do ponto onde havia terminado o de Luiz Henrique Ferreira Romão, o Macarrão, condenado em novembro do ano passado.
Mulheres acertam as contas com o goleiro Bruno
A grande expectativa não se confirmou: a de confissão de Bruno. Como a Justiça concede benefícios a quem colabora com a elucidação dos crimes, o goleiro poderia tentar admitir, ainda que parcialmente, sua participação no crime. Para o Ministério Público, as revelações de Bruno não poderiam ser enquadradas como confissão passível de benefício. Bruno primeiro atribuiu a culpa da trama a Macarrão, depois disse que soube que Bola matou Eliza – relatos apresentados na quarta-feira. Nesta quinta-feira, o réu pediu novamente para falar, e afirmou que sabia que Eliza seria levada para a morte. O promotor Henry Castro não considerou as declarações como confissão, e decidiu, então, pedir pena máxima para o goleiro. "Por lei, a delação simples não tem peso legal e não reduz a pena", explicou Castro.
Como o goleiro Bruno atraiu Eliza Samudio para a morte
Defesa – Em sua vez de falar aos jurados, o advogado Lúcio Adolfo tentou esvaziar os depoimentos mais importantes contra Bruno: os relatos de Macarrão e de Jorge Luiz Rosa Sales, primo do goleiro que era menor de idade na época do crime. Para Adolfo, Jorge Luiz mentiu várias vezes e não deveria ter seu depoimento levado em conta. Em sua réplica, o promotor Henry Castro fez duros ataques a Adolfo, acusando-o de ter manobrado para evitar o depoimento do primo do goleiro, e dizendo que o rival havia articulado a entrevista de Jorge ao ‘Fantástico’, há duas semanas.
Restou a Adolfo tentar, então, amenizar as penas de Bruno. Com críticas ao que chamou de falhas processuais, à emissão de um atestado de óbito que indicava asfixia como causa da morte de Eliza e críticas ao MP, ele pediu que Bruno fosse considerado um participante de “menor importância no crime”. “A pena não deve passar de 10 anos”, disse, tentando abrandar o castigo para seu cliente.
O cálculo da juíza para chegar aos 22 anos e três meses de pena é o seguinte: por homicídio, 20 anos, reduzidos para 17 anos e seis meses por ele ter delatado o ex-policial Bola; desse total, ele tem que cumprir 2/5, ou seja, sete anos. Como está preso há dois anos e nove meses, poderá progredir para o regime semiaberto em 2017. Por sequestro, Bruno recebeu três anos e três meses de prisão. Por ocultação de cadáver, Bruno recebeu pena de um ano e seis meses.
Para Sônia de Fátima Moura, mãe de Eliza Samudio, o resultado, apesar de representar um avanço, ainda não é satisfatório. Sônia afirmou que pretende recorrer da absolvição de Dayanne. "Não estou feliz. Mas sinto que o dever foi cumprido. Só vou ficar satisfeita quando puder enterrar minha filha", disse.
Bruno, que sucumbiu aos poucos, indo de uma postura desafiadora, na época do crime e na fase de investigação, ao total abatimento, às lágrimas, apegado a uma bíblia, chorou ao ouvir o veredicto da juíza Marixa Fabiane Rodrigues. Marixa escreveu, em seu veredicto, que o julgamento concluiu haver “culpabilidade intensa e altamente reprovável”, agravada por ter o crime, entre seus réus, “um jogador de futebol famoso”. A juíza afirmou também que um dos agravantes é a “incógnita deixada sobre onde está o corpo da vítima”. “A sociedade reconheceu envolvimento do mandante (Bruno) na trama diabólica”, disse. O promotor Henry Vasconcelos Castro pretende recorrer da sentença, pois considera necessária pena entre 28 e 30 anos para o réu. A defesa também anunciou que já recorreu da condenação.
TEMA EM FOCO: Acompanhe o Caso Bruno
A condenação no Tribunal do Júri de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, foi fruto da decisão de sete jurados, cinco deles mulheres. O desfecho final do caso ainda está por vir, com o julgamento do ex-policial Marcos Aparecido dos Santos, o Bola, no dia 22 de abril. Dois ex-policiais ainda estão sendo investigados por suspeita de participação na ocultação de cadáver de Eliza – o mistério até hoje guardado por seus algozes. O Ministério Público, representado pelo promotor Henry Vasconcelos Castro, acredita que Bola seja o executor e o responsável pelo sumiço no corpo de Eliza.
Henry Castro comemorou mais uma condenação dos réus do Caso Bruno. Foi ele também quem obteve as condenações de Luiz Henrique Ferreira Romão, o Macarrão, e de Fernanda Gomes de Castro, ex-namorada de Bruno, que cumpre pena em regime aberto.
Iniciado na segunda-feira, o julgamento do goleiro Bruno foi bem menos tumultuado que o de Macarrão. E foi marcado por uma tentativa da acusação de reforçar a ideia de que Bruno participou da cena do crime – algo que a defesa e as testemunhas tentaram afastar – e que foi o mandante, a pessoa interessada em obter benefício com a morte de Eliza.
Primeira a ser interrogada ao longo do júri, Dayanne, que vinha mantendo-se em silêncio e chegou a afirmar, ao longo do processo, ter sofrido coação por parte da polícia e do MP, fez declarações importantes. Mas nenhuma delas encaradas como confissão. Para o conjunto do processo, as principais informações foram a atribuição de culpa a Bruno – segundo Dayanne, o ex-marido pediu que ela mentisse sobre a presença do menino Bruninho, já depois da morte de Eliza – e a declaração incisiva em relação ao ex-policial José Lauriano de Assis Filho, o Zezé. Este novo personagem, que esteve presente no motel em que Eliza e os acusados pernoitaram, a caminho do sítio do goleiro, e é suspeito de participação na ocultação de cadáver, corre risco de enfrentar também um julgamento semelhante. Além dele, há um terceiro policial sendo investigado no caso – os dados são mantidos em sigilo, apesar de um vazamento ter legado a Polícia Civil mineira a confirmar a existência do inquérito. Henry Castro explicou, ainda no plenário do Tribunal do Júri, a razão de não ter denunciado Zezé. "Ainda não recebi todos os elementos no tempo que gostaria", disse Henry.
Cronologia - Relembre os principais fatos do Caso Bruno
Com um forte conjunto de provas – apesar de o corpo nunca ter sido localizado – a defesa de Bruno ficou diante do seguinte cenário: o goleiro admitiu saber que Eliza Samudio seria assassinada, afirmou que se beneficiaria disso, pediu à ex-mulher para mentir sobre o menino Bruninho. Tudo isso em um julgamento que começou com uma certeza: a vítima está morta, independentemente de o corpo nunca ter sido encontrado, e a causa da morte foi asfixia.
A manutenção da validade do atestado de óbito de Eliza Samudio, emitido em janeiro, a pedido da juíza Marixa Fabiane Rodrigues, começou a definir como acusação e defesa se posicionariam ao longo do julgamento de Bruno. A defesa tentou invalidar o documento para, assim, ter a opção de sustentar a negação do crime. A estratégia não funcionou, e o júri começou do ponto onde havia terminado o de Luiz Henrique Ferreira Romão, o Macarrão, condenado em novembro do ano passado.
Mulheres acertam as contas com o goleiro Bruno
A grande expectativa não se confirmou: a de confissão de Bruno. Como a Justiça concede benefícios a quem colabora com a elucidação dos crimes, o goleiro poderia tentar admitir, ainda que parcialmente, sua participação no crime. Para o Ministério Público, as revelações de Bruno não poderiam ser enquadradas como confissão passível de benefício. Bruno primeiro atribuiu a culpa da trama a Macarrão, depois disse que soube que Bola matou Eliza – relatos apresentados na quarta-feira. Nesta quinta-feira, o réu pediu novamente para falar, e afirmou que sabia que Eliza seria levada para a morte. O promotor Henry Castro não considerou as declarações como confissão, e decidiu, então, pedir pena máxima para o goleiro. "Por lei, a delação simples não tem peso legal e não reduz a pena", explicou Castro.
Como o goleiro Bruno atraiu Eliza Samudio para a morte
Defesa – Em sua vez de falar aos jurados, o advogado Lúcio Adolfo tentou esvaziar os depoimentos mais importantes contra Bruno: os relatos de Macarrão e de Jorge Luiz Rosa Sales, primo do goleiro que era menor de idade na época do crime. Para Adolfo, Jorge Luiz mentiu várias vezes e não deveria ter seu depoimento levado em conta. Em sua réplica, o promotor Henry Castro fez duros ataques a Adolfo, acusando-o de ter manobrado para evitar o depoimento do primo do goleiro, e dizendo que o rival havia articulado a entrevista de Jorge ao ‘Fantástico’, há duas semanas.
Restou a Adolfo tentar, então, amenizar as penas de Bruno. Com críticas ao que chamou de falhas processuais, à emissão de um atestado de óbito que indicava asfixia como causa da morte de Eliza e críticas ao MP, ele pediu que Bruno fosse considerado um participante de “menor importância no crime”. “A pena não deve passar de 10 anos”, disse, tentando abrandar o castigo para seu cliente.
O cálculo da juíza para chegar aos 22 anos e três meses de pena é o seguinte: por homicídio, 20 anos, reduzidos para 17 anos e seis meses por ele ter delatado o ex-policial Bola; desse total, ele tem que cumprir 2/5, ou seja, sete anos. Como está preso há dois anos e nove meses, poderá progredir para o regime semiaberto em 2017. Por sequestro, Bruno recebeu três anos e três meses de prisão. Por ocultação de cadáver, Bruno recebeu pena de um ano e seis meses.
Para Sônia de Fátima Moura, mãe de Eliza Samudio, o resultado, apesar de representar um avanço, ainda não é satisfatório. Sônia afirmou que pretende recorrer da absolvição de Dayanne. "Não estou feliz. Mas sinto que o dever foi cumprido. Só vou ficar satisfeita quando puder enterrar minha filha", disse.
(Cecília Ritto e Pollyane Lima e Silva, do Rio de Janeiro)
Fonte: Revista Veja, 08/03/2013