JOÃO BOSCO RABELLO, 19/06/14, Estadão
A menos de duas semanas de sua aposentadoria, a renúncia à relatoria da Ação Penal 470 – o mensalão – pelo ministro Joaquim Barbosa, guarda um aparente paradoxo, já que a saída da vida pública provocaria o mesmo efeito. Dois aspectos, no entanto, explicam a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, pela ordem: marcar [...]
A menos de duas semanas de sua aposentadoria, a renúncia à relatoria da Ação Penal 470 – o mensalão – pelo ministro Joaquim Barbosa, guarda um aparente paradoxo, já que a saída da vida pública provocaria o mesmo efeito.
Dois aspectos, no entanto, explicam a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, pela ordem: marcar posição em relação ao caso, ante a perspectiva de revogação de suas últimas decisões, e pressão dos colegas para que as submeta ao plenário antes de deixar o tribunal.
No primeiro caso, deixando a relatoria antes de sua saída, Barbosa impede que isso ocorra de forma natural com sua aposentadoria. Faz questão de antecipar o que seria consequência do ato anunciado há semanas.
Com isso, marca seu protesto contra o PT e seus advogados que considera partidários, e dá nitidez à sua ausência no contexto de uma provável decisão do tribunal favorável à prisão semiaberta imediata para os condenados. A moderação no tratamento aos réus presos será já outra etapa do processo, na qual ele não estará.
Equivale a dizer: até onde fui, a justiça foi feita, sem distinguir cabeças coroadas do réu comum. Sua nota de renúncia deixa claro o protesto contra a politização do caso pelo PT que o escolheu como algoz, embora as condenações tenham sido obra de conjunto, da maioria do tribunal.
Ocorre que, perdida a causa, a defesa dos réus passou a utilizar todos os recursos disponíveis para reduzir ao máximo as sentenças, direito legítimo da advocacia. No entanto, a ação dos advogados aliada à pressão pública do PT, tornou cada etapa desse processo um desgaste pessoal para Barbosa.
Sobretudo depois que o plenário do STF, com nova composição, passou a divergir de seu presidente em decisões pontuais. Foi assim no caso da formação de quadrilha, que manteria José Dirceu e outros em regime fechado, e também na questão sobre o trabalho externo, que Barbosa negou com base em jurisprudência do STF que só prevê o benefício depois de cumprido um sexto da pena.
Estava desenhada igualmente a derrota na decisão relativa ao ex-deputado José Genoíno, que insiste na prisão domiciliar, negada com base em laudos médicos oficiais que divergem dos privados apresentados pelo ex-deputado – um deles de junta da Universidade de Brasília e, outro, da própria Câmara, que negou-lhe aposentadoria por invalidez, considerando-o apto ao trabalho.
Barbosa baseou-se em ambos para manter Genoíno na penitenciária, mas foi contestado pelo Procurador Geral, Rodrigo Janot e criticado pelos colegas por retardar a submissão de sua decisão ao plenário.
Outro aspecto, é que após o surto profissional do advogado de José Genoíno, na tribuna do STF, de onde criticou e ameaçou Barbosa por não submeter o recurso contra a permanência de seu cliente no presídio, a cobrança de seus pares pela apreciação de seu voto pelo plenário se intensificou.
Embora não tenham se insurgido contra a expulsão do advogado do tribunal, os ministros do STF, em sua maioria, consideram que o episódio era evitável se Barbosa não postergasse o envio de seu voto ao plenário.
Esse contexto retirou praticamente a possibilidade de Joaquim Barbosa evitar o exame pelo plenário dessas questões até a sua aposentadoria. Prova disso é a intenção do seu substituto, já sorteado, Luís Roberto Barroso, de submeter ao plenário os recursos da defesa de José Dirceu e Genoíno, na próxima semana.
Quando Barbosa ainda estará no STF, embora não mais relator. Barroso precisará, porém, da ação de Barbosa para pôr o tema na pauta, o que não parece ser o desejo do ainda presidente do STF.
Não o fazendo, Barbosa empurra Barroso para a decisão monocrática, se q uiser dar ao exame do assunto a celeridade que defende em favor dos direitos dos presos ao julgamento dos recursos.
Barroso já deu sinais de que está mais inclinado a acatar a posição do Procurador Geral, Rodrigo Janot, em relação a José Genoíno, do que manter a de Barbosa. Igualmente deve se posicionar contrário à exigência de cumprimento de um sexto da pena por José Dirceu para que possa assumir um trabalho externo.
Juridicamente, é provável que a defesa dos condenados conquiste seus objetivos, a essa altura tão somente relativos às condições de cumprimento das penas.