segunda-feira, 2 de abril de 2018

Jejum de Dallagnol para pressionar ministros do STF, anunciado publicamente, causa reações ácidas: contraria a Bíblia, diz deputada que foi freira

01 de abril de 2018 às 21h59

Quando jejuardes, não vos mostreis contristados como os hipócritas; porque desfiguram o rosto com o fim de parecer aos homens que jejuam. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa. Tu porém, quando jejuares, unge a tua cabeça, e lava o teu rosto, para não parecer aos homens que jejuas, e sim, a teu Pai, em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará publicamente. Mateus 6.16-18
Da Redação

A decisão do procurador da Lava Jato, Deltan Dallagnol, de fazer jejum — e anunciá-lo publicamente — causou reações ácidas.

“Deltan PowerPoint Dallagnol é uma figura patética. Um procurador do MP que anuncia jejum contra a Constituição nem disfarça o seu ativismo cretino”, escreveu o senador Lindbergh Farias (PT-RJ).

O procurador anunciou o jejum no twitter, diante da iminente decisão do STF, que pode confirmar ou não a possibilidade de prisão de réus condenados em segunda instância ao julgar o habeas corpus do ex-presidente Lula, na próxima quarta-feira.

Em duas mensagens disparadas na rede social, o procurador explicou que não busca a prisão de Lula, mas combater a impunidade.

Primeiro, ele escreveu:

“4ª feira é o dia D da luta contra a corrupção na Lava Jato. Uma derrota significará que a maior parte dos corruptos de diferentes partidos, por todo país, jamais serão responsabilizados, na Lava Jato e além. O cenário não é bom. Estarei em jejum, oração e torcendo pelo país”.

Em seguida, emendou:

“Quem acha q nosso alvo é colocar pessoas na cadeia erra o ponto. Trabalhamos p/ reduzir a corrupção e o sofrimento que ela gera: doenças, mortes, fome, desigualdade. É uma questão de justiça social e de realização de direitos humanos. Agora, isso passa pela redução da impunidade”.

Em resposta, o juiz Marcelo Bretas, que cuida dos casos da Lava Jato no Rio, escreveu: “Caro irmão em Cristo, como cidadão brasileiro e temente a Deus, acompanhá-lo-ei em oração, em favor do nosso País e do nosso Povo”.

Além do jejum, Dallagnol anunciou orações e promoveu um abaixo-assinado para que o STF mantenha seu entendimento de outubro de 2016 quando, por 6 a 5, “legislou” que a prisão antecipada, antes do trânsito em julgado, não viola o princípio constitucional da presunção de inocência.

O abaixo-assinado, com mais de 4 mil adesões do Ministério Público e da Justiça, será entregue ao STF nesta segunda-feira, 2.

“Sinceramente, esse senhor faz uso impróprio da religião nas atribuições profissionais de uma carreira de estado, portanto laicas. A publicidade desse uso só comprova que seu objetivo não é cristão, mas alimentar sua vaidade”, escreveu a deputada Maria do Rosário (PT-RS).

A deputada Manuela, pré-candidato do PCdoB ao Planalto, retuitou mensagem da colega acreana, a ex-freira Perpétua Almeida (PcdoB-AC), que lembrou Mateus 6.16-18, segundo o qual o jejum deve ser secreto.

O ex-governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, lamentou a manifestação do procurador da Lava Jato nas redes sociais:

“Onde chegamos com a midiatização do Processo Penal e com a Justiça-Espetáculo? No fundo do Poço”.

Apresentando-se como “seguidor de Jesus” no twitter, Deltan Dallagnol tem mais de 400 mil seguidores e é um procurador de forte militância nas redes sociais: compartilhou, por exemplo, o texto de José Padilha sobre o seriado O Mecanismo, da Netflix, e acrescentou: “Nosso desafio é impor a ele [mecanismo], em 2018, a maior derrota da história, nas eleições”.

Nem todos concordam com tal ativismo.

“Deltan Dallagnol, o criador do famoso powerpoint, faz jejum para prisão de Lula. Além de Procurador da República, ele encontra tempo para dar palestras pagas, praticar coaching milagrosoe pressionar o STF pela internet”, comentou o pré-candidato do Psol ao Planalto, Guilherme Boulos.

O coaching milagroso mencionado por Boulos se deve ao fato de que Dallagnol é integrante da Igreja Batista do Bacacheri, em Curitiba, e fez um tour para vender a campanha das 10 Medidas Contra a Corrupção, que encabeçou no MPF, com um tom um tanto messiânico (ver vídeo acima).

Por outro lado, segundo o Valor Econômico, só em 2016 Dallagnol recebeu R$ 219 mil por palestras.

O ex-ministro da Justiça, Eugênio Aragão, chegou a acusar Dallagnol de comerciar com bem público:

“É claro que seu sucesso no show business se dá porque é membro do Ministério Público, promovendo sua atuação como se mercadoria fosse. Um detalhe parece que lhe passou talvez desapercebido: como funcionário público, lhe é vedada atividade de comércio, a prática de atos de mercancia de forma regular para auferir lucro”, escreveu.

Dallagnol disse que sua atividade como palestrante era “legal, lícita e privada”. O Conselho Nacional do Ministério Público arquivou por unanimidade representação contra ele dos deputados Wadih Damous e Paulo Pimenta, alegando que as palestras são consideradas “docência”, o que está previsto em lei.

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