sexta-feira, 13 de março de 2015

Tolerância nos dias 13 e 15 de março: O outro não é seu inimigo

Política é bom e é sensacional que as pessoas estejam vivendo, fazendo e respirando política.

Mas, como já disse aqui durante aquela zorra em que se transformaram as eleições do ano passado, fazer política significa também estômago forte e alma tranquila, considerando que está em jogo a forma pela qual achamos que o país deve ser conduzido.

Ou seja, em tese, o seu interlocutor – seja ele um avatar estranho teclando loucamente em uma rede social ou o seu melhor amigo lançando perdigotos em um debate acalorado – não é seu inimigo. Ele está no mesmo barco e, também em tese (ok, pelo menos em tese), compartilha com você um mesmo objetivo comum: uma vida melhor.

Enfim, manter um mínimo de civilidade é importante, como sempre lembro por aqui. Até porque a vida continua depois que as faixas e cartazes forem recolhidos. Tomo a liberdade, portanto, neste momento de ânimos exaltados, de retomar o que já escrevi sobre o tema.

Pois você fica satisfeito em só ter amigos e amigas que concordam com você? Se sim, pense em como isso é triste! Há pessoas que parecem não aceitar serem questionadas. Talvez para afastar os medos e inseguranças sobre suas próprias crenças.

Acredito que meu ponto de vista está correto. E defendo-o de corpo e alma. Mas sei que isso não faz dele o único. Uma outra pessoa pode defender que a forma mais correta de acabar com a fome, a violência, as guerras, a injustiça seja por outro caminho. Já encontrei respostas para indagações pessoais em pessoas que escrevem sob um ponto de vista totalmente diferente do meu. E, creio, que o mesmo já aconteceu.

Desse enfrentamento de ideias e de propostas sairá um vetor resultante que apontará para uma direção, dependendo da correlação de forças envolvidas, dos atores dedicados a isso, da aceitação dessas propostas pelo restante de uma sociedade.

Eu sei que é duro acreditar nisso neste momento, com manifestações praticamente antagônicas marcadas com dois dias de distância. E, pior: com as redes sociais distribuindo granadas à população para que entre em uma guerra fratricida.

Mas vamos discutir os argumentos que embasam as diferentes posições e não chamar o outro de canalha ou burro, esquerdista idiota ou direita fascista, e travar por aí a discussão. A saída para contrapor uma voz não é um xingamento, mas sim outra voz.

Discordo o que defendem vários veículos de comunicação ou colegas de profissão, mas não quero que eles fechem ou sejam atacados. Pelo contrário, desejo que se fortaleçam, bem como as vozes dissonantes a eles, de forma a contemplar devidamente o espectro ideológico, garantindo ponto e contraponto, peso e contrapeso à democracia.

Repetindo Voltaire, discordo, mas defendo o direito de que seja dito. Lembrando, contudo, que os discursos que incitarem a violência a terceiros, indo contra o que está determinado pela Constituição, terão que responder legalmente após serem ditos. Nunca antes, pois isso seria censura.

Muitos simplesmente repetem mentiras que leem na internet, ouvem em bares ou veem na igreja e não param para pensar se concordam ou não realmente com aquilo. É um Fla-Flu, um nós contra eles cego, que utiliza técnica de desumanização, tornando esse outro uma coisa sem sentimentos.

É mais fácil pensar de forma binária, preto no branco, os de lá, os de cá. “Ah, mas você faz isso, japs!'' Todos nós em alguma medida fazemos, infelizmente. Mas é como percebemos isso e atuamos para mudar nossas atitudes que realmente conta. Afinal, ninguém nasce pronto.

Pois, caso contrário, a vida vai ficando mais pobre, paramos de evoluir como humanidade. Do outro lado sempre estará um monstro e do lado de cá os santos. Isso sem contar a impossibilidade de apreciar tudo o que o outro tem de melhor – do ombro amigo à conversa inflamada em uma mesa de bar.

Sugiro para esta sexta (13) e domingo (15), que busquem a tolerância no diálogo, mesmo que firme e duro, e se perguntem se acham que estão certos a todo o momento, uma vez que nossa natureza não de certezas e sim de dúvidas e falhas que só poderão ser melhor percebidas no tempo histórico.

Fonte: Blog do Sakamoto/Uol, 13/03/15

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